sexta-feira, maio 16, 2008


A nova esquerda europeia nasce entre Berlim e Viena

Por Paulo Casaca

O Fórum para a Liberdade do Médio Oriente de Berlim e o "Stop the Bomb" (parem a bomba) de Viena promoveram, nos dias 2 e 3 de Maio, conferências sobre a ameaça de holocausto nuclear da teocracia iraniana. Organizações Não Governamentais recentes, nascidas da rejeição da ameaça neonazi da teocracia iraniana e da defesa do direito à existência de Israel e dos judeus – como de todos os países e de todos os povos – a sua característica básica comum é a de serem formadas por jovens vindos de organizações de esquerda – e mesmo de esquerda radical – em ruptura com a contemporização dos seus Estados Maiores com o fascismo religioso e nacionalista no Grande Médio Oriente.

A esquerda dos princípios e dos valores é uma esquerda que preza a vida, a liberdade, a tolerância e a solidariedade como valores supremos e que não se pode remeter a plataformas saídas de intrincados raciocínios sobre poderes e relações de força. Durante muito tempo a manipulação dos árabes da Palestina pelas autocracias da região, com a cobertura mediática e estratégica ocidental, transformaram aquilo que não é mais do que uma das manifestações de intolerância contra as minorias, numa luta entre espoliados de terras e de nacionalidade contra um impiedoso opressor. As limpezas étnicas que foram depurando todo o Grande Médio Oriente, primeiro de judeus, mas depois de cristãos, de Druzos, de Bahai, de curdos, de turcomanos, de yazedis e de tantos outros, o extremismo nacionalista árabe primeiro e o fanatismo islâmico depois, foram menorizados na sua ameaça e sistematicamente desculpados como "reacção à agressão sionista" ou qualquer outro disparate do género, ou ainda pura e simplesmente assumidos como custos naturais e inevitáveis do petróleo e do mercado.

Quando os dirigentes iranianos começaram a negar a verdade do Holocausto, a conspirar com os neonazis europeus na perseguição dos judeus, dos seus opositores ou mesmo – como aconteceu comigo – dos dirigentes políticos europeus que se lhes opõem, a proclamar o esmagamento do Estado de Israel, aí finalmente houve quem entendesse que se tinha ido longe de mais na desculpabilização do fascismo islâmico. Parte da velha esquerda parece ter sucumbido ao apelo do petróleo, utiliza a retórica do multicultaralismo para esconder a intolerância étnica, cultural e religiosa, e não se distingue por isso do que sempre foi a direita dos interesses em quem repentinamente descobre virtudes antes desconhecidas. A luta contra o fascismo religioso é a luta pela libertação dos povos do Grande Médio Oriente, a começar naturalmente pelo mundo árabe. Quem oprime o mundo árabe não é Israel ou o sionismo, são exactamente aqueles que em nome da defesa da sua religião pretendem mantê-lo acorrentado a mitos e práticas profundamente reaccionárias.

Como dizia o manifesto de um movimento britânico também presente na conferência, o "Democratiya": "Sectores da esquerda deixaram-se remeter a um canto incoerente e negativo do "anti-imperialismo" perdendo contacto com os valores tradicionais democráticos, igualitários e humanistas".
E mais adiante:
"Democratiya defende as bandeiras das revoluções democráticas dos séculos XVII e XVIII. Essas ideias tornaram-se a herança de todos pelas revoluções social-democratas, feministas e igualitárias dos séculos XIX e XX".
Recentemente, o Bloco Nacionalista Galego sofreu uma cisão exactamente pelo carácter xenófobo e anti-semita da pretensa posição anti-imperialista da direcção do bloco. Pouco a pouco, vai-se erguendo uma nova esquerda, e eu creio que neste princípio de Maio, entre Berlim e Viena, ela se tornou imparável.

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